DIRETÓRIO MUNICIPAL DE CAUCAIA
NOTA DO DIRETÓRIO DO PARTIDO DOS TRABALHADORES DO MUNICÍPIO DE CAUCAIA PELA SUSPENSÃO DO PROJETO DE USO DAS ÁGUAS DO LAGAMAR DO CAUÍPE
Ao Diretório Estadual do PT Ceará
Ao Governador Camilo Santana e
Parlamentares do PT Ceará
Prezados companheiros e companheiras de luta do Diretório Estadual do Partido dos Trabalhadores do Ceará, Excelentíssimo Senhor Governador Camilo Santana, Deputados Estaduais, federais e Senador da República do PT Ceará,
O Partido dos Trabalhadores desde a sua criação vem se pautando pela defesa dos direitos humanos e fazendo o enfrentamento necessário para a promoção e defesa dos direitos da classe trabalhadora, especialmente defendendo as agendas progressistas e positivas dos movimentos sociais e demais seguimentos que construíram a identidade do nosso partido.
No Ceará, o nosso partido tem uma importante marca de protagonismo nas causas ambientais, na luta pela reforma agrária, apoio as lutas de acesso aos territórios indígenas e quilombolas, nas questões de gênero e das pessoas com deficiência, na questão da promoção étnica e racial, da juventude e na defesa da água e outras importantes áreas. Assim, o modo petista de governar deve estar alinhado a essas causas e bandeiras de luta, bem como deve ser encarado como a principal estratégia de planejamento e de implementação de um modelo de gestão compartilhada, norteado por um conjunto de princípios democráticos construídos ao longo da formação da nossa identidade partidária.
Nos últimos anos, temos assistido uma verdadeira guerra pelo acesso e uso da água. Uma luta por vezes silenciada mas que vem ganhando lugar de destaque em nosso Estado, especialmente pelo fato de nessa guerra, termos a clareza da atuação do Poder Público por vezes comprometida prioritariamente para atender aos anseios de uma indústria sedenta por água em detrimento das demandas legítimas de regiões, municípios e comunidades que vem sofrendo com falta dágua para o próprio consumo humano.
A ampliação no sofrimento do cearense, relativa a limitação de acesso aos recursos hídricos se dar especialmente pelo fato do nosso estado está atravessando o sexto ano de seca. Nossos reservatórios nunca estiveram com a sua capacidade tão baixa como estão agora. Acreditamos que não é somente a estiagem prolongada que tem gerado o esvaziamento nos nossos reservatórios, mas sobretudo o direcionamento da água para a indústria e para o agronegócio, base de uma política contraditória, e que investe os valores morais que acreditamos, especialmente pelo fato do fato de não atacarmos esse problema na sua raiz.
Do conjunto de municípios existentes em nosso estado, a estimativa é de que mais de 70% tenham decretado situação de emergência ou calamidade por conta dos efeitos provocados pela seca. Muitas das nossas cidades e comunidades estão sendo abastecidas pela operação pipa, que tem enfrentado problemas com denúncias ligadas a qualidade da água, fraude e ainda problemas com a redução de recursos para a sua manutenção.
Acreditamos que a atual política de gestão dos recursos hídricos no Ceará está em crise e gerando colapso no abastecimento, justamente pelo fato de não priorizar a água para as pessoas e para isso justificamos com alguns dados importantes agora.
A CAGECE tem cobrado uma tarifa extra do consumidor residencial caso não racione o uso da água. Até uma campanha capitaneada pelo Governo do Estado atribui somente aos consumidores residenciais a responsabilidade de poupar água por meio da Campanha “Cada gota conta”, enquanto que somente a Termelétrica do Pecém consome água suficiente para abastecer uma cidade de 600 mil habitantes e ainda ganha como bonificação do Estado do Ceará o desconto de 50% na cobrança de sua tarifa;
Os perímetros irrigados que sustentam o agronegócio também é uma verdadeiro ralo por onde a nossa água passa. Para exemplificar um caso concreto citamos o açude Banabuiú, que secou após as empresas que cultivam frutas para exportação terem consumido toda a sua água, além de terem contaminado por exemplo o aquífero Jandaíra, maior do Ceará com o uso de agrotóxicos.
No levantamento feito referente as outorgas concedidas pela Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos – COGERH, autarquia vinculada à Secretaria de Recursos Hídricos do Estado do Ceará pudemos perceber tamanha contradição na atual política de gestão da água em nosso estado. Esses dados apontam que somente a Federação das Associações do Perímetro Irrigado Jaguaribe Apodi estejam consumindo 553 milhões de litros de água por dia. Já a AMBEV consome em nosso estado uma quantidade de 20 milhões de litros de água por dia. A mina de Itataia consome 23 milhões de litros de água por dia e o empreendimento Aquiraz Hotelaria sozinho, consome 6 milhões de litros de água por dia. Em nosso município, o que tem nos trazido bastante preocupações é o fato de somente as Termoelétricas e a Siderúrgica do Pecém estejam consumindo uma quantidade de 226 milhões de litros de água por dia.
É importante salientar que o Plano Nacional de Segurança Hídrica e o Plano Estadual de Segurança Hídrica do Estado Ceará prevê como diretriz norteadora das políticas de gestão e segurança hídricas a prioridade do fornecimento de água para o consumo humano e não para indústria, assim, não podemos aceitar inertes ou omissos que o nosso Estado, que passa por uma crise hídrica, continue dando as empresas, o direito de usar cerca de 61% de toda nossa água.
Em Caucaia, temos estado do lado da população que tem rejeitado o projeto de uso das águas do Lagamar do Cauípe, sobretudo por termos construído uma compreensão a partir das informações prestadas por técnicos e por documentos publicizados de que as águas do Cauípe seria mais uma vez para saciar a sede das indústrias do Pecém e não voltadas ao consumo humano de diversas comunidades que não estão sendo abastecidas sequer pelas ações de perfuração de poços profundos ou pela operação carro pipa.
Na área de influência direta do Lagamar do Cauípe, 27 comunidades estão desabastecidas de água. Um levantamento feito pela SOHIDRICA resultou num compromisso para a perfuração de de 36 poços, no entanto essa promessa vem sendo usada como uma espécie de pressão nas comunidades locais para que aceitem a implementação do Projeto de Uso das Águas do Lagamar do Cauípe, como condição para que os poços sejam efetivamente perfurados.
O mandato do nosso único vereador em Caucaia, Vereador Weibe Tapeba, que também é o único indígena vereador pelo PT no Ceará tem se colocado ao lado das comunidades impactadas por esse empreendimento e tem dado visibilidade há uma série de dispositivos legais que estariam sendo frontalmente violados. Evidenciamos alguns desses pontos:
1 - O Lagamar do Cauípe constitui-se como sendo uma Área de Preservação Ambiental – APA, instituída pelo Decreto Estadual nº 24.957, de 05 de Junho de 1998. A obra ora questionada está em desacordo com o próprio decreto instituidor da respectiva APA, já que o Art.3°, VI, é taxativo ao asseverar que:
Art.3° Nas APAs do Lagamar do Cauípe e do Pecém, ficam proibidas ou restringidas:
VI – Qualquer forma de utilização que possa poluir ou degradar os recursos hídricos abrangidos pela APA, como também, o despejo de efluentes, resíduos ou detritos, capazes de provocar danos ao meio ambiente.
2 – O projeto de uso das águas do Lagamar do Cauípe apresenta inconsistência também referente aos direitos de consulta as comunidades afetadas, especialmente pelo fato da própria SEMACAE, órgão gestor das APAs no Ceará, reconhecer tais comunidades como sendo comunidades tradicionais. No que tange aos direitos das Comunidades Tradicionais, o Estado Brasileiro reconheceu os direitos desses grupos sociais por meio do Decreto n° 6.040, de 07 de fevereiro de 2007, que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. A referida norma legal, prevê em seu inciso X, do Art.1º do anexo Único, que “a promoção dos meios necessários para a efetiva participação dos Povos e Comunidades Tradicionais nas instâncias de controle social e nos processos decisórios relacionados aos seus direitos e interesses”, fato que lamentavelmente foi violado.
3 – Vale ressaltar que o Decreto Estadual instituidor da referida APA, assegura a instituição de um Comitê Gestor composto por instituições públicas e representantes da Sociedade Civil responsável pela gestão da respectiva Área de Preservação Ambiental – APA e que a informação repassada pela COGERH foi que o referido comitê não estaria funcionando e que por tanto não se manifestou sobre o referido projeto, o que também apresenta inconsistência jurídica no controle social e gestão de sua única instância gestão.
4 – Na Audiência Pública realizada pela Câmara de Vereadores de Caucaia, perguntou-se sobre a realização dos Estudos de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambienta – EIA – RIMA. A COGERH não confirmou se tais estudos foram realizados o que demonstra claro indícios de irregularidades, já que a legislação ambiental vigente assegura a necessidade de realização de tais estudos para demonstrar a sua viabilidade ambiental ou não.
5 – Ainda respectiva aos procedimentos de consulta, a Convenção n° 169, da Organização Internacional do Trabalho, assegura em seu Art.6° o direito a consulta prévia, livre e informada de todo o empreendimento suscetível de afetar tais comunidades, fato que vem gerando discussões, já que a COGERH e Secretaria dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará, realizou apenas reuniões informativas, sem o devido caráter de audiência pública, como a legislação ambiental prevê;
6 – O projeto também apresenta vícios de ilegalidade ao infringir a Instrução Normativa nº 01/2010, da própria SEMACE, prevê que:
Art.9º, §3º, Quando a localização de empreendimento for em município cujo território contenha terra indígena demarcada ou em processo de demarcação, a licença prévia só será emitida com a anuência da Fundação Nacional do Índio – FUNAI. Fato que merece elucidação formal, tendo em vista que o município de Caucaia possui duas Terras Indígenas (Tapeba e Anacé) e a FUNAI não tendo sido instada a emitir tal anuência, especialmente pelo fato de comunidades indígenas Anacé serem diretamente afetada pelo respectivo empreendimento, será mais uma evidência de violação a legislação vigente.
Doravante ao que foi exposto, solicitamos o acolhimento e apoio do nosso Diretório Estadual referente aos termos desta nota. Aos nossos parlamentares, rogamos pelo apoio a esta causa fazendo reverberar em todos os espaços possíveis palavras, gestos e ações concretas de defesa das comunidades afetadas por esse empreendimento. Ao Governador Camilo Santana, também militante do Partido dos Trabalhadores, rogamos pela imediata suspensão das obras do uso do Lagamar do Cauípe. As indústrias do Pecém possuem tecnologia e dinheiro suficiente para encontrar uma solução hídrica para saciarem a sua sede. O modo petista de governar ensina que o olhar de uma gestão petista deve priorizar as demandas da sociedade, por isso, olhe mais para as comunidades rurais do nosso município e garanta o acesso a água para elas.
Água para o Povo!
Água para quem precisa!
Somos todos e todas Cauípe!
Caucaia-CE, 29 de Novembro de 2017.
Atenciosamente,
DIRETÓRIO MUNICIPAL DE CAUCAIA